Charge correta - medalhas

A Câmara Municipal de Santos, por meio do vereador Braz Antunes (PSD, 3º Mandato), colocou na ordem do dia, pelo artigo 24 do Regimento Interno (regime de urgência), um projeto absolutamente dispensável e que cria despesas sem trazer retorno concreto para a população.

Trata-se de mais uma medalha. Isso mesmo. O Projeto de Lei 213/2019 prevê que a Prefeitura crie a “Medalha do Mérito Farmacêutico” para o profissional que se destacar dentro de alguma farmácia municipal.

Sabemos que os servidores farmacêuticos merecem todo o reconhecimento. Mas será que melhor reconhecimento não viria na forma da melhoria das condições de trabalho e da valorização da carreira via melhor remuneração dos mesmos?

Matéria recente do site G1 deu detalhes da situação das farmácias públicas na Baixada Santista, alvos de uma vistoria realizada por técnicos do Tribunal de Contas.

Em Santos várias irregularidades no fornecimento de medicamentos foram apontadas na fiscalização surpresa. Segundo a corte de contas, a Seção Ambulatório de Especialidades da Região Central (Seambesp) não possui Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB) e nem alvará da Vigilância Sanitária.

Além disso, a farmacêutica que consta no Conselho Regional de Farmácia (CRF) como responsável técnica não estava presente, pois se encontrava de licença médica. No seu lugar, havia uma farmacêutica substituta, mas que não constava registro no CRF como responsável e nem substituta.

Além disso, na unidade não há controle de temperatura e umidade, os aparelhos de ar condicionado precisam de manutenção, não existem extintores de incêndio, há umidade/mofo aparentes, a sala apresenta goteiras em dias de chuva, o local é quente, devido ao não funcionamento do ventilador e ar condicionados, o ambiente é pequeno, não há área física e instalações para recebimento e conferência dos medicamentos e não há atendimento preferencial.

Os problemas não param por ai: foi identificado medicamento armazenado com data de fabricação e vencimento posteriores aos que estavam para dispensação, foram flagrados medicamentos acondicionados em embalagem terciária na farmácia e no estoque, ficou constatado que não há controle de estoque e que o sistema que funcionava não está mais operante há seis meses. Os fiscais ainda encontraram medicamentos com prazo de validade próximo ao vencimento, medicamentos de controle especial sem que haja controle da entrada e saída e ainda medicamentos encostados na parede. Tudo isso fere portarias específicas do setor.

Na rede municipal o número de farmacêuticos não corresponde ao número de unidades de saúde. Há ainda problemas de defasagens salariais. Obtivemos informações de que há técnicos de farmácia com remuneração superior a farmacêuticos. As distorções nos rendimentos dos farmacêuticos nunca foram corrigidas. Outro problema muito comum nas farmácias é o tamanho dos locais. São sempre muito pequenos e improvisados.

Outro ponto que poderia ser objeto de cobrança e pressão dos vereadores é a falta de remédios nas unidades municipais e também estaduais. O desabastecimento tem sido uma constante, ainda que as causas estejam na relação entre Ministério da Saúde e laboratórios.

O fato é que há muita coisa mais importante para os parlamentares se debruçarem em relação ao sistema de fornecimento de medicamentos. Além de uma Medalha de Mérito Farmacêutico não ser prioridade, há servidores que temem que a homenagem seja mais um meio de beneficiar profissionais com critérios muito mais políticos e de alinhamento com a gestão do que propriamente técnicos e de performance no serviço.

Pautação a jato

O projeto que cria a nova medalha foi apresentado no dia 6 de agosto deste ano, na 41ª sessão legislativa. Onze sessões depois, na 52ª, em 12 de setembro já estava pautado. Um recorde! Ainda mais comparando-se com outros projetos com temas mais pertinentes, que muitas vezes ficam mais de um ou dois anos na geladeira antes de serem colocados na ordem do dia.

A ideia da nova medalha foi aprovada em primeira discussão, porém, o uso do artigo 24 pegou tão mal que outros vereadores aconselharam o autor a retirar o selo de urgência e a propositura foi encaminhada para análise nas comissões.

Braz defendeu a relevância do projeto. Justificou que deu uma turbinada na tramitação porque está na iminência de ter de devolver a cadeira ao titular do posto, Hugo Dupreé. O atual presidente da Fundação Pró-Esporte de Santos (Fupes) teria manifestado a intenção reassumir o cargo para o qual foi eleito no Legislativo. Braz, que é suplente, sairia de cena.

Dança das cadeiras à parte, queremos mais uma vez saber: para quê tanta homenagem? É para isso que a Câmara serve? Vereadores de Santos, para quem eles trabalham?