dsc_0057-300As eleições para vereadores em Santos podem movimentar oficialmente mais de R$ 106 milhões. Isto se cada uma das 380 candidaturas gastar o limite de R$ 280 mil previsto na lei eleitoral. Trata-se de um processo caro em vista do retorno gerado para a população, e que reproduz com fidelidade outras disputas existentes na sociedade. A observação mais atenta sobre o conjunto de circunstâncias em que as eleições são realizadas mostra aspectos que indicam recortes de cor ou raça, sexo, nível de renda e ocupação.

Um sistema político partidário que exige profundas reformas gera tristezas e decepções. Tanto para candidatos que conquistam o poder político quanto para a população que espera poder contar com seus escolhidos na formulação de leis para o aprimoramento da sociedade, fiscais dos gastos públicos e impulsionadores do desenvolvimento sócio econômico e cultural.

Na prática a situação é bem outra. O suposto desejo de servir à população tem de aliar-se a um poder de cartório representado pelos partidos. Isto posto deve haver um casamento no qual para concorrer o postulante precisa ter algum dote para obter legenda. Começa ai um jogo interno, no qual muitíssimas vezes as cartas já estão marcadas. É o pantanoso terreno das promessas. Basicamente é isto que pode levar o candidato à decepção. Para candidatar-se ele ouve promessas de receber materiais, recursos e apoio. Nem todos conseguem.

Um dos partidos de sustentação ao governo tucano de Santos pode servir como exemplo. Com uma chapa de quase 30 nomes, nem todos recebem o mesmo tratamento. Consta que uma leva de vereadores, com nomes proeminentes, recebeu já nos primeiros dias, materiais fornecidos pela coligação. Uma segunda parte foi ver o material muito mais tarde. É apenas um pequeno exemplo de como candidaturas podem naufragar. Neste campo, o tráfico de influências deita e rola.

Em eleição tudo pode ocorrer, mas a possibilidade do improvável é bastante reduzida. Mais recursos, mais visibilidade, mais chances de eleição. O sol nasceu para todos, mas em política, nasceu somente para alguns. Na estatística do Tribunal Superior Eleitoral – TSE sobre as candidaturas em Santos, a maioria é branca, formada por empresários do sexo masculino. Dentre as ocupações, quase 10% são empresários (36, ou 9,21%), 26 são advogados (6,6%) e comerciantes, 15 (ou 3,84%). Dentre os candidatos 11 são servidores públicos (2,81%).

A questão de gênero também é definidora. 64,92% dos candidatos são homens. As mulheres são 30,95%. O Brasil tem 52% de mulheres. A participação da mulher cresceu nos últimos vinte anos por conta de imposições legais. 30% das candidaturas em cada partido são reservados ao público feminino. A taxa de mulheres candidatas em Santos ficou no limite. O descumprimento desta regra por uma única candidatura inviabiliza todas as demais. Quem alerta é o Ministério Público da Função Eleitoral, que realizou discussão recente em São Paulo.

A questão da representatividade é delicada, uma vez que é um episódio comum postulantes inscreverem-se no processo e não saírem às ruas com campanha organizada. A situação aproxima-se do uso de laranjas, aqueles que emprestam os nomes para compor chapa fictícia. Um partido da base aliada em Santos estaria com problemas. De pouco menos de 20 candidatos só a metade está em campanha. A consequência é que os “desinteressados” não ajudam com votos para compor o coeficiente partidário. Ou, para ajudar a eleger os mais visíveis, os queridos do partido ou do governo.

Outro recorte da estatística do TSE é quanto à cor. Os brancos são 68,54%; declararam-se pardos 17,14%, de cor preta, 9,72% e amarela, 0,51%. Vê-se que situações perpetradas na historia do país se reproduzem no sistema político.

Há fatores diversos que passam pelas situações aqui relatadas, e que, em maior ou menor número, indicam que o processo político existente facilita ou propicia uma retroalimentação que mantém o status quo e a corrupção. Fica difícil crer que representantes verdadeiramente populares tenham a chance de consagrar-se maioria, permitindo ao menos o desejável debate político no Parlamento municipal. Sem oposição, ou com a mesma reduzida, como em Santos, não há o contraditório e apenas uma voz, neste caso a que ocupa a cadeira principal no Palácio José Bonifácio, dita e determina regras. O eleitor deve levar muito em conta esta definição. O candidato vai ser eleito para apenas dizer amém?